sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Desinfetantes e Sanitizantes – Conceitos Básicos




Olá caros colegas. No post de hoje vou fazer uma abordagem sucinta sobre desinfetantes e saneantes, de maneira a introduzir o assunto sobre limpeza e sanitização. Este é um assunto extenso, com vários aspectos a serem abordados, e que vai render mais de um post. Vou começar com as definições básicas, que, apesar de serem básicas, é importante conhecermos os termos de modo a poder aplicar de maneira correta o produto e obter os resultados desejados.

Nomenclatura

Antisséptico: um agente que inibe ou destrói micro-organismos no tecido vivo, incluindo a pele, cavidade oral, e feridas abertas. Seu principal objetivo é matar ou inibir o crescimento de micro-organismos de maneira segura para o individuo.

Antibacteriano: um agente que reduz/mata um determinado número de bactérias. Usualmente apresentam características de desempenho inferiores aos desinfetantes.

Antimicrobiano: este termo pouco informa sobre a natureza da atividade ou micro-organismo alvo. Podem matar ou simplesmente inibir o crescimento microbiano e incluem antibióticos e agentes de tratamento anti-acne.

CIDA: sufixo usualmente acrescentado à classe de organismos para indicar um agente que lhes é letal.

Desinfetante: um agente químico usado em superfícies inanimadas e objetos para destruir fungos infecciosos, vírus e bactérias, mas não necessariamente, os seus esporos. Variam em seu espectro de atividade, modo de ação e eficácia. Esporicidas e agentes antivirais podem ser considerados uma classe especial de desinfetantes. Desinfetantes são frequentemente classificados como de alto nível, de nível intermediário e de baixo nível com base na sua eficácia contra vários micro-organismos.

Detergentes: agente químico usado para a limpeza de equipamentos ou superfícies, para remoção de matéria orgânica não desejada. Muitos detergentes possuem aditivos químicos em sua formulação que podem apresentar características desinfetantes.

Esterilizante: é um agente capaz de promover a letalidade de todas as formas de vida microbiana, incluindo bactérias, esporos bacterianos, fungos, esporos fúngicos e vírus, mas não necessariamente viróides ou príons. Esterilizantes podem ser desinfetantes que necessitam de tempo de contato maior para atingir a letalidade de endósporos bacterianos.

Fumigação: desinfecção indireta com um líquido ou gás, dentro de uma área fechada.

Germicida: outro termo genérico usado para indicar a habilidade de um agente químico em provocar a letalidade de vários tipos de organismo, semelhante ao termo “antimicrobiano”. É mais comumente empregado na América do Norte.

Sanitizante: é um termo frequentemente confundido ou usado de forma não apropriada. Refere-se a compostos que reduzem, porém não eliminam completamente o número de micro-organismos em superfícies inanimadas. Os sanitizantes não são substituídos pelos desinfetantes, por frequentemente apresentarem menor eficácia.

-Stático: este sufixo designa substancias que apenas inibem o crescimento microbiano, podendo por consideradas com espectro bacteriostático, fungistático etc.

Uma vez conhecendo bem o significado de cada classe de desinfetantes e sanitizantes, fica mais fácil a escolha do produto a ser utilizado na rotina.

Todas as classes apresentam limitações e pontos fortes. Portanto, saber a faixa da atividade e o mecanismo de ação são importantes. Abaixo seguem tabelas descrevendo estes dois pontos:

Classificação Química dos Agentes Desinfetantes
Classes Químicas
Apresentação
Faixa de Atividade
Aldeídos
2% glutaraldeído, formaldeído (como gás)
Bactericida, fungicida, micobactericida, virucida, esporicida
Álcoois
70% isopropanol
70% etanol
Bactericida, fungicida, virucida (atividade limitada)
Biguanidas
0,1% de poli-hexametileno biguanido (PHMB)
0,5% de gluconato de clorexidina
Bactericida, fungicida, virucida (atividade limitada)
Compostos clorados
0,5% de hipoclorito de sódio
Bactericida, fungicida, micobactericida, virucida, esporicida
Peroxido de hidrogênio
Solução 10-25% de peroxido de hidrogênio
Bactericida, fungicida, micobactericida, virucida, esporicida
Ácido peracético
Solução de 0,2% de ácido peracético
Bactericida, fungicida, micobactericida, virucida, esporicida
Compostos fenólicos
500µg/g de clorocresol ortonil fenol
Bactericida, fungicida, micobactericida, virucida
Compostos de amônio quaternário
200 µg/g de cloreto de benzalcônio
Bactericida (exceto em alguns tipos Gram-negativos), fungicida, virucida (atividade limitada)


Mecanismo de Atividade Desinfetante Contra Células Microbianas
Alvo
Desinfetante
Parede celular
Formaldeído, hipoclorito e glutaraldeído
Membrana citoplasmática, potencial ação em membrana
Anilinas e hexaclorofeno
Enzimas de membranas, ação na cadeia de transporte de elétrons
Hexaclorofeno
Ação em ATP
Clorexidina e óxido de etileno
Ação em enzimas com grupos –SH
Óxido de etileno, glutaraldeído, peróxido de hidrogênio, hipoclorito e iodo
Ação sobre a permeabilidade geral da membrana
Álcoois, clorexidina e compostos de quaternário de amônio
Conteúdo celular, coagulação geral
Clorexidina, aldeídos e compostos de quaternário de amônio
Ribossomos
Peróxido de hidrogênio
Ácidos nucleicos
Hipocloritos
Grupos tióis
Óxido de etileno, glutaraldeído, peróxido de hidrogênio e hipoclorito
Grupos aminos
Óxido de etileno, glutaraldeído e hipoclorito
Oxidação geral
Hipoclorito

Essas são as informações iniciais para a escolha correta do esquema de limpeza e sanitização. Mas sabemos que há muito mais a ser considerado, como legislação, validação, eficácia etc. Isso fica para outros posts, para não ficar cansativo.

Até o próximo post!

Fontes:

UNITED States Pharmacopeia. 37ª ed. 2014
PINTO, T.J.A.; KANEKO, T.M.; PINTO, A.F. Controle Biológico de Qualidade de Produtos Farmacêuticos, Correlatos e Cosméticos

quinta-feira, 8 de setembro de 2016

Ser um "contador de bactérias" ou um Microbiologista?


Enquanto elaboro um novo post técnico, faço uma pausa para reflexão.

Iniciei minha vida de laboratório em 2003, fazendo estágio em um laboratório terceirista. Estagiei por um ano e meio e consegui um estágio numa grande multinacional de alimentos. Mas fiquei nesta empresa por pouco tempo, logo fui chamada de volta ao antigo laboratório para uma vaga de analista. A escolha foi difícil, sair de uma multinacional tradicionalíssima e sonho de muitos profissionais para voltar a um laboratório pequeno. Mas eu encarei a volta, pois na multinacional provavelmente eu terminaria o estágio e teria que procurar emprego, dificilmente seria efetivada. Não por falta de capacidade, mas por falta de vaga. Como me disseram na época: “Aqui só se efetiva um estagiário se um analista morrer”.

Voltei e me tornei analista. Mas em questão de três meses tive outro desafio: a proposta de assumir a supervisão do setor no qual fui estagiária e mal esquentei o lugar de analista. Fiquei apavorada! Recém-formada (me formei em Biologia e em meu curso, os quatro primeiros anos eram para licenciatura e o 5º ano para o bacharelado, opcional. Comecei a cursar, mas logo parei). Relutei em aceitar, mas meu diretor convenceu-me. Trabalhei cinco anos como supervisora da área de Microbiologia, o laboratório com o maior número de ensaios da empresa. Confesso que olhando pra trás, não me considero uma excelente supervisora. Meu perfil é de analista, bancada, e um cargo de chefia te obriga a lidar com papéis e problemas. Mas tirei algo de muito bom desse período: o aprendizado, o jogo de cintura, a capacidade de resolver problemas que tiravam o sono.

Como era um laboratório terceirista, eu tinha a obrigação de saber de tudo um pouco: Farmacêuticos, Cosméticos, Descartáveis, Alimentos, Dispositivos médicos, Água... Conhecer legislação, compêndios, métodos, pois além de conduzir os ensaios, tinha que atender o cliente, tirar suas dúvidas e enfrentar uma auditoria por mês. Tinha que estar afiada para treinar minha equipe e solucionar tudo. Confesso que foi difícil, mas cresci muito como profissional.

Como supervisora, tive a oportunidade de conhecer muitos representantes comerciais, e um deles, logo no inicio me ensinou uma valiosa lição, que direcionou a maneira que eu conduzi minha carreira. Eis o que ele me disse:

“Na Microbiologia, existem os contadores de bactérias e os microbiologistas. O contador de bactéria acredita em tudo o que ele lê numa placa, num tubo etc. Simplesmente lê e anota o resultado. Já o microbiologista para, analisa, pensa se aquele resultado é verdadeiro ou se não foi um desvio analítico, uma contaminação no meio da análise. O que você quer ser? Uma contadora de bactéria ou uma microbiologista?”

Eu escolhi ser a Microbiologista. Meu trabalho não terminava no horário do expediente. Eu fiz cursos, li, pesquisei. Não estou dizendo que devemos esquecer nossa vida particular e só pensar no trabalho. Longe disso! Mas separar um tempo pra estudar e se atualizar é fundamental.

Outro ponto é o raciocínio, a investigação. Quando eu me via diante de um problema, eu não sossegava enquanto não encontrasse a solução. Pesquisava em livros, conversava com colegas (e nesse tempo não tinha grupo de whats pra me ajudar, era tudo no telefone, até em auditorias, eu aproveitava a experiência do auditor e trocava ideias com ele, para melhorar meus procedimentos e métodos, muitas vezes na cara de pau).

Ser microbiologista é ser um detetive, bem ao estilo Sherlock Holmes. Observar, conhecer o histórico do seu produto ou processo e desconfiar quando algo sai do padrão. Buscar informações. Hoje, a internet oferece um mundo de possibilidades, mas é preciso saber filtrar também. E estudar, fazer cursos, ler artigos, estar antenado às mudanças e se adaptar ao novo.

Por razões de força maior, estou fora da vida de analista há quase quatro anos. Mas isso não foi motivo para enterrar todo o conhecimento que acumulei. Lógico, passei um período me dedicando à minha saúde integralmente, mas quando a poeira baixou, voltei a estudar, por conta própria mesmo. E agora me dedico a ajudar outras pessoas, porque conhecimento não se guarda, ele deve ser compartilhado. É a minha maneira de contribuir para o aprimoramento dessa área que tanto gosto.

Meu recado aqui é esse: não sejam “contadores de bactérias”, tornem-se Microbiologistas. Não se rendam ao mais fácil. Aprendam com os erros, compartilhem esse aprendizado. Quem segue por esse caminho, com certeza será um profissional respeitado e deixara sua contribuição nessa área tão importante que é a de controle de qualidade. Isso vale pra qualquer profissional.

É isso. Estou elaborando um post técnico, um pouco mais complexo, por isso a demora. Mas logo estará aqui.